O que Trump significa para quem
quer estudar nos EUA
Estudante de Harvard comenta sobre a preocupação
dos estudantes internacionais diante do resultado das eleições.
Por
Priscila Bellini
Atualizado
em 24 de novembro de 2016.
O clima de incredulidade dominou
os Estados Unidos após a vitória do republicano Donald Trump. Durante os meses
de campanha, nenhuma das pesquisas apontava a eleição do candidato. Antes da
virada surpreendente na noite de terça-feira, a democrata Hillary Clinton
dominava as previsões e se especulava que os resultados girariam em torno de
60% em favor do Partido Democrata.
Com a vitória nas mãos e 290
colégios eleitorais a favor de Trump, as dúvidas sobre o futuro do país
começaram a surgir. A campanha do candidato eleito ficara marcada por mensagens
xenófobas e uma postura intolerante a camadas minoritárias da população, como a
população LGBTQ e os latinos. Mas, depois das urnas apuradas, a questão
levantada por vários setores foi a mesma: as atitudes de Trump enquanto
governante serão correspondentes ao que defendeu ao longo dos debates e
discursos?
No campo da educação superior, em
que as instituições americanas lideram os principais rankings de qualidade de
ensino, o clima de dúvida também prevaleceu. Os discursos feitos sobre
imigrantes, em especial sobre latinos, asiáticos e muçulmanos de várias
nacionalidades, alarmaram os estudantes. A proposta divulgada por Trump de
construir um muro na fronteira com o México, por exemplo, além da ideia de
expulsar determinados imigrantes ou barrar a entrada de estrangeiros demonstrou
hostilidade. Em uma pesquisa feita com mais de 40 mil participantes
desenvolvida pela FPP EDU Media (organização que liga os estudantes
internacionais a oportunidades no exterior) e pela International Education
Advantage LLC (companhia de marketing para universidades), constatou-se que 60%
dos estudantes de fora do país estariam “menos dispostos” a estudar nos Estados
Unidos se Trump ganhasse as eleições. Ainda que a previsão de declínio nas
applications não se concretize por completo, chegando ao marco dos 60%, há um
receio de que o número de estrangeiros diminua.
Depois das urnas apuradas, a
questão levantada por vários setores foi a mesma: as atitudes de Trump enquanto
governante serão correspondentes ao que defendeu ao longo dos debates e
discursos?
O que estudantes das melhores
universidades estão pensando
Como Renan Ferreirinha, estudante
de Economia na Universidade Harvard, conta, o dia seguinte à eleição foi
repleto de debates nas aulas da instituição. “Foi um dia de reflexão, em que
todo mundo queria entender o que aconteceu”, ele explica. Na opinião dele,
havia uma crença de que o candidato republicano era “muito ruim” e não seria
eleito nos Estados Unidos. “É como se o Brasil tivesse perdido de 7 a 1, mas
tivesse jogado bonito”, compara. Pelas regras do jogo, o “7 a 1” americano prevalece,
ainda que Clinton tenha feito uma boa campanha, pautada em sua experiência
enquanto política.
Em termos práticos, Renan já
reconhece um medo real sentido por parte dos estudantes estrangeiros, tanto em
Harvard quanto em outras instituições. Segundo ele, o dia após a eleição também
foi de “muito abraços”, já que os alunos de fora sentiam medo das futuras
propostas de Trump e da onda de xenofobia que assola o país. “O Trump não vai
ser tão extremista quanto parece, não acredito que ele vá construir o muro, ou
que ele vai expulsar muçulmanos. Mas ele não precisa fazer isso, o medo que foi
criado no país é horrível o suficiente”, analisa Renan.
Os especialistas em educação
superior ainda dividem opiniões sobre o tema. Durante a campanha, os temas
mencionados giraram em torno de mudanças nos empréstimos estudantis e das
dívidas estudantis, sem um detalhamento sobre as possíveis modificações. De
toda forma, é difícil cravar um resultado mais provável. Resta saber como as
universidades americanas sentirão os efeitos do novo governo republicano.
Tendências para o governo Trump
Declarações feitas por Trump e
por membros de sua equipe de campanha deram sinais sobre os primeiros passos
tomados pelo presidente eleito, a partir do ano que vem. Em uma entrevista sobre
educação superior para o site Inside Higher Ed, ainda em outubro, o
conselheiro político Sam Clovis tratou do assunto, e destacou medidas voltadas
aos estudantes americanos.
Por exemplo, haveria mudanças nas
regras para empréstimos estudantis, ou loans, obrigando as instituições
de ensino a “dividir os riscos” nesses casos. Outro ponto destacado por Clovis
trata das “liberal arts” — como artes plásticas, design, história –,
cursos nos quais os alunos terão mais dificuldade em garantir financiamento,
principalmente fora das instituições pioneiras nos Estados Unidos.
Apesar de se referirem aos alunos
americanos, a princípio, tais medidas podem atingir também estrangeiros. Para o
editor do Inside Higher Ed, Scott Jaschik, outros
aspectos da campanha de Trump acendem o alerta vermelho para quem vem de fora.
“O candidato republicano frequentemente criticou as universidades por serem
politicamente corretas, e seus comentários sobre não-americanos nos Estados
Unidos preocuparam os líderes nas universidades que dependem dos estudantes
internacionais”.
O clima de incerteza persiste, já
que o presidente eleito mudou várias vezes sua posição quanto a assuntos
ligados à imigração, concessão de vistos e outras medidas que impactam os
estudantes internacionais. Só sobre o visto H-B1, que permite o trabalho nos
Estados Unidos para alunos com formação superior, por exemplo, seu discurso
oscilou bastante. No site da campanha, inicialmente, Trump desencorajava as
empresas americanas a contratar estrangeiros, e logo depois condenou o uso do
H-B1 para atrair mão-de-obra estrangeira barata.
Segundo o analista Pravna Sharma,
da Moody’s Investors Service, essas especulações sobre o futuro do
país já diminuiriam o número de estudantes que se candidatam às universidades
americanas. Como ele destaca em seu relatório sobre o tema, “há exemplos
numerosos de como a inscrição de candidatos de países estrangeiros pode
rapidamente variar com base em mudanças nas políticas nacionais e
internacionais adotadas no país”. Como cita a Moody’s, esse efeito acompanharia
mudanças em programas de bolsa e imigração, que podem estar na mira de Trump.
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