Écoles francesas: instituições
tradicionais focadas em engenharia
Formação generalista, fundamentos
técnicos e estágios fazem parte da experiência em Nantes e Lyon. Saiba mais
sobre a vivência de brasileiros nas écoles francesas.
Por
Priscila Bellini
As grand écoles francesas,
instituições tradicionais pelo ensino de engenharias e de áreas mais técnicas,
atraem alunos de todo o mundo. A ideia, com a criação das “escolas” era, já no
século XVIII, fornecer ao país mais trabalhadores qualificados com aptidões
técnicas e industriais.
A ligação das écoles com o Brasil
é fortalecida não só por alunos que optam por estudar em terras francesas logo
no início da formação, mas também por convênios estabelecidos com instituições
brasileiras. Entidades como a USP (Universidade de São Paulo), a UFRJ
(Universidade Federal do Rio de Janeiro) e a PUC-Rio (Pontifícia Universidade
Católica do Rio de Janeiro), por exemplo, estabeleceram contratos para
encaminhar estudantes que se destaquem pelo perfil acadêmico para lá.
Ao contrário do que acontece, em
geral, no Brasil, as carreiras em engenharia nas écoles contam com currículos
mais generalistas. Em vez de, por exemplo, segmentar a formação para a área de
Engenharia de Produção, ou Engenharia Elétrica, um candidato no ambiente
acadêmico francês se depara com matérias mais abertas. Entram na lista de
matérias disponíveis nas escolas temas como marketing, línguas (tanto a
francesa quanto as estrangeiras, como o inglês), e assuntos da engenharia que
não necessariamente compõem seu campo de interesse.
A grade é voltada para um
profissional generalista, capaz de resolver problemas multidisciplinares. Também
tem grande ênfase na parte prática, com muitos laboratórios e projetos
Conheça abaixo duas das grand
écoles francesas, a Centrale de Nantes e a Centrale de Lyon, e entenda quais as
impressões dos estudantes brasileiros que passaram parte da formação por lá.
École Centrale de
Nantes
A sexta cidade mais populosa da
França foi berço de grandes nomes como o escritor Julio Verne. Hoje em dia, ela
tem mais de 800 mil habitantes e conta com a École Centrale de
Nantes, um dos nomes de destaque da engenharia na França,
fundada em 1919.
A ECN oferece aos estudantes um
ambiente internacionalizado, com alunos de 55 países, e um fluxo generoso de
alunos estrangeiros. Para se ter uma ideia, em 2015, a instituição contava com
65 acordos de duplo-diploma, como os estabelecidos com universidades
brasileiras. Depois da formação na ECN, os dados oficiais dão conta de que 24%
dos formandos encontram os primeiros postos de trabalho fora da França e seguem
de imediato carreiras internacionais.
Dentro de sala de aula, a
estrutura da ECN é mais rígida, mesmo se comparada ao Brasil. Como o engenheiro
de produção Flávio Raposo destaca, o perfil “mais sério” se reflete na figura
do professor, mais tradicional e institucional. “Em Nantes, o aluno é submetido
a perguntas e convidado a ir ao quadro resolver exercícios”, conta Flávio, que
participou do programa de duplo-diploma ligado à UFRJ.
Há mais de um tipo de aula
frequentado durante a graduação por lá. A maioria delas entram na categoria das
expositivas, com o professor à frente da sala explicando o conteúdo. “São uma
espécie de palestra em auditório com todos os alunos, em que há pouca interação
e funciona de forma basicamente unilateral”, explica Flávio. Existem, ainda,
matérias para exercitar a parcela teórica dos cursos. Nas disciplinas de
Trabalho Dirigido, por exemplo, o aluno deve realizar exercícios propostos nos
livros e apostilas. Já na de Trabalho Prático, cabe ao estudante desenvolver e
executar projetos, além de escrever relatórios sobre o assunto.
Para além do tempo em classe, os
estudantes podem aproveitar as atividades extras, em diversos ramos. “A
associação de alunos (Bureau des Éleves), de esportes (Bureau du Sport) e das
artes (Bureau des Arts) realizam atividades durante a semana e nos fins de
semana, além de viagens e passeios que recebem apoio institucional e financeiro
da école”, conta o engenheiro.
Outra novidade oferecida pela ECN
é o Centrale-Audencia-ENSA Business Incubator, em que os alunos podem
desenvolver start-ups com apoio da instituição de ensino. Pelas estimativas
divulgadas, 79% das empresas criadas ali duram mais de cinco anos.
École Centrale de
Lyon
Fundada em 1857, é uma das
instituições de ensino superior francesas mais tradicionais, que está fora da
região parisiense. A localização da École também ganha destaque por favorecer uma
vida universitária rica, já que Lyon ocupa o segundo lugar em concentração de
estudantes na França. Lyon também serviu de berço para nomes importantes na
história francesa, como os irmãos Lumière, considerados os inventores do
cinema.
Quem embarca para Lyon procurando
um curso em engenharia depara-se com uma formação bastante generalista, que
reúne aspectos de diversas especializações. Isso chamou a atenção da brasileira
Sara Nishimura, que optou pelo duplo-diploma através da parceria estabelecida
com a USP. Em vez de focar o ensino da Engenharia Elétrica, formação original
na instituição paulista, Lyon expandia o currículo para outras sub-divisões. “A
grade é voltada para um profissional generalista, capaz de resolver problemas
multidisciplinares. Também tem grande ênfase na parte prática, com muitos
laboratórios e projetos”, resume Sara, que voltou ao Brasil e logo conseguiu um
estágio em uma empresa francesa. “Complementando o ensino técnico, eles
procuram incluir na grade matérias de humanas, como sociologia e filosofia”.
Encaminhar os estudantes para
oportunidades profissionais também faz parte da postura da instituição.
Estágios são comuns mesmo entre os alunos internacionais. “Fiz dois estágios
durante o período na França. Um é o chamado de “operário”, no chão de fábrica
de uma empresa de metalurgia, e outro chamado de “engenheiro”, no setor de
pesquisa e desenvolvimento da Airbus”, conta Sara. É uma colocação no mercado
que ajuda a entender aspectos cruciais. No estágio operário, como a brasileira
destaca, pôde perceber “as tensões entre os operários e gestores” — uma nova
visão dentro do aprendizado na engenharia.
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